Uma carta de alguém que vive o Natal de fora…

segunda-feira, 24 de dezembro de 2007

Tenho desde há uns tempos para cá ouvido falar muito de Natal, não sei o que isso é, mas sinto que deve ser uma data importante.
Vivo na rua desde que me lembro, aliás, não me lembro quando vim viver para a rua. Aqui o tempo deixa de fazer sentido, os dias sucedem-se numa roda viva, onde o hoje é o dia seguinte do ontem e o amanhã, se lá chegar, é o seguinte do hoje.
Sinto que as pessoas andam mais apressadas nesta altura. Vejo-as mais carregadas de compras. Passam por mim, e como sempre nem sequer olham (acho que têm medo)… Mas eu não me importo já estou habituado. As ruas estão iluminadas, até há música nelas. Eu gosto muito de música, alegra-me o coração, deixa-me mais feliz, faz com que me esqueça de todos os problemas que vivo. Os sacos das pessoas são diferentes, as cores mais alegres, alguns deles até têm umas fitas coloridas e brilhantes. São muito lindos.
Talvez, daqui a uns dias, quando os deitarem fora, eu ainda consiga arranjar algum que esteja bom e o aproveite para mim… dava jeito, para eu levar o meu papelão dobrado e a almofada que encontrei um dia destes…
Andam por aí uns homens vestidos de vermelho, com umas barbas. Não sei quem são, mas os meninos da minha idade correm todos para eles e ficam felizes quando se sentam no colo deles. Eles dão-lhe atenção, falam com eles, abraçam-nos, dão-lhe um sorriso. Um dia destes corri também para um, afinal eu sou criança, mas ele não quis saber de mim. Mandou-me embora de uma forma agressiva, falou-me alto, berrou comigo e só não me bateu porque eu fugi mais do que ele. Ele não foi nada simpático comigo. E eu que só queria um abraço, um carinho, nada de mais, mesmo que não me sentasse no colo porque o podia sujar… Sabes, nesse dia correu uma lágrima salgada pelo meu rosto que foi morrer na minha boca. Era tão amarga a gotinha. Mas eu dei-lhe o carinho que o homem não me deu. Fiz com que ela caísse na minha língua, e mesmo amarga como era, saboreei-a, engoli-a, e aconcheguei-a no meu estômago.
Vejo nestas alturas imensos meninos como eu que passam junto a mim. Gostava tanto de brincar com eles, mas eles não querem brincar comigo e os pais também não os deixam. Houve até um grupo deles que ao passar por mim gozou-me muito, fez-me sentir muito mal, acho que me queriam bater, mas eu mais uma vez fugi e eles não foram atrás de mim…
Já estou habituado, mas como agora vejo tanta gente na rua pensei que as coisas iam ser diferentes…
Ah, mas há já uma coisa boa… Desde que puseram aquela árvore iluminada, tenho ido dormir lá junto dela. Está tão quentinha, nem preciso de me tapar com os jornais velhos, esta noite até calor tive… por isso hoje estou tão feliz.
Espera, olha, está alguém a dirigir-se a mim… já volto, vou ver o que quer….
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Não sei como continuar a escrever, as lágrimas caem pela minha cara de tal forma que parece que estou a lavá-la. Era uma jovem. Mais velha do que eu, veio ter comigo. Pensei que era mais uma que precisava de saber onde ficava alguma coisa. Afinal não, era mesmo para falar comigo. Perguntou-me o meu nome, hesitei, quase não me lembrava, é que há já tanto tempo que ninguém mo perguntava… Lá lho disse a custo, e ela, reponde-me: olá, eu chamo-me Sandra! Estou aqui porque esta é a altura de Natal e venho perguntar-te qual é o presente que queres??? Eu ofereço-te um desde que não seja muito caro, é que as minhas economias também não andam lá muito boas…. Eu pedi-lhe aquele presente que sempre desejei e nunca tinha tido:
Pedi-lhe que me desse carinho durante um bocadinho. Que me abraçasse, que me passasse a mão pela cabeça, que me desse um beijo, e que no fim olhasse para mim, e sorrindo me dissesse que eu era especial e único. Foi o que ela fez, mas fê-lo com tanto carinho, com tanto sentimento, com tanta verdade que eu desatei a chorar…
Agora sei o que é o Natal!
O Natal é o tempo em que todos os nossos desejos são cumpridos, em que tudo o que pedimos nos é concedido. O Natal é a festa onde o carinho e o amor abundam e as pessoas se preocupam realmente com os outros.
Vou dormir, estou cansado mas feliz...
Jesus, espero que tenhas gostado, desculpa a letra, mas como tu me dizes para não me preocupar com isso… Vê se apareces mais uma vez, porque já tenho muitas saudades tuas. Mas sabes o que é estranho??? Hoje ao olhar para a Sandra vi nela o Teu rosto, o Teu olhar, as Tuas mãos, e acima de tudo o Teu coração…
Deste teu amigo, Lázaro…

11 Disseram...:

Elsa Sequeira disse...

Lindo, sem palavras....e com lágrimas!

Feliz Natal e um bom Ano Novo!

Beijinhos

Paula Raposo disse...

Deixaste-me o coração muito apertado de lágrimas...muitos beijos.

Paulo disse...

Lindo...

Alien David Sousa disse...

Um beijinho Catarino, regressa que estás perdoado...depois de ter lido este conto...estás! ;)

Claudia Sousa Dias disse...

Olá Ctarino black scorpion!

Gostei do teu conto de Natal que tem um vago sabor a Hans Cristian Andersen, Dickens e Oscr Wilde!

Um beijinho e espero que tenhas tido o carinhon da menina da tua história de Natal, durante a quadra festiva...!


CSD

Claudia Sousa Dias disse...

Olá catarino mais uma vez!

tens a resposta ao teu comentário no hasempreumlivro...se quiseres depois passar lá...


Um abraço


CSD

Matilda disse...

olá Catarino,
passei por cá por acaso e não posso passar sem deixar um comentário.
está muito bom este texto,fiquei muito sensibilizada e...com lágrimas.acho que escreve muito bem.

um beijinho*, matilda

A Flor disse...

Olá Catarino! :)

Fiquei tão contente com a tua "presença" lá no meu cantinho... obrigado Amigo pelas tuas palavras de ânimo...


Seria tão bom que regressasses à blogoesfera... tenho saudadinhas tuas!... :)

Peço a Deus que tudo esteja bem contigo e que Jesus continue a caminhar a teu lado. :)

Fica bem, fica com Deus

Beijinho da amiga Flor com enorme carinho :)

Claudia Sousa Dias disse...

Olá Catarino!

Passei para desejar um bom Carnaval. Ainda não consegui ler os contos que me enviaste mas já estive a dar uma vista de olhos. Vou lê-los atentamente logo depois do dia 15 de Fevereiro, que é a dta do cineliterário (tenho de ler e comentar o "Orgulho e Preconceito" e mais duas obras literárias)e ainda as Correntesd'escritas na Póvoa, maior festival de literatura de espressão ibero-americana e luso-africana da Península.

Depois já fico mais livre...


CSD

Kalinka disse...

Amigo Catarino
este ano de 2008 ainda não postou.
Aguardo um novo post seu.

No Dia Mundial do Doente, a minha mensagem é:
Neste dia de afectos, não esquecer que a nossa saúde mental e física beneficia também da atenção e carinho que dedicarmos aos nossos mais próximos e semelhantes.

Um abraço.

A Flor disse...

Beijinho, beijinho e beijinho doce para ti, Amigo! :)


Foi bom sentir-TEEEEEE! :)

Que Jesus te ilumnine e guarde

Flor com amizade :)